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9 de agosto de 2017

9 de agosto de 2017 por Manuela Alves comentários
Quando descobri, nos registos de casamento de 1851 da freguesia da Sé, o segundo casamento do pai da minha trisavó Ana Olinda de Lemos deparei-me com uma história familiar que me remeteu para o ano de 1833 e para um episódio vivido durante o Cerco do Porto.

Aguarela de Alfredo Roque Gameiro



Conta-nos Júlio Joaquim da Costa Rodrigues da Silva [1], que no dia 1.° de Janeiro de 1833 chegou à barra do Porto a expedição do general Solignac com o seu estado-maior e 200 belgas vindos de Ostende via Falmouth na Inglaterra. Estas zonas já tinham sido contaminadas pela epidemia de cólera e durante a viagem declararam-se a bordo casos da moléstia. Avisado o ministério e D. Pedro IV do que se passava, foi enviada uma ordem ao inspector de saúde do exército para inspeccionar o navio, informar de imediato o que encontrasse e proibir, se necessário, o desembarque. Inexplicavelmente este foi autorizado e realizou-se na Foz. Os doentes, transferidos para os hospitais militares do Porto, propagaram a doença para a população civil, a partir do bairro de St.° Ildefonso, onde viviam as lavadeiras dos referidos estabelecimentos.

As deficiências alimentares resultantes do cerco e as péssimas condições higiénicas ajudaram à progressão da epidemia que atingiu o máximo em meados de Fevereiro, mantendo-se estacionária nos meses de Março a ]unho, declinando rapidamente em ]ulho e extinguindo-se em Agosto. 

Numa população calculada em 80.000 habitantes terão morrido cerca de 3.261. A violência do surto epidémico parece ter surpreendido o governo liberal que inicialmente reagiu lentamente e com hesitação. É verdade que logo após a irrupção do surto de cólera e durante o cerco actuou drasticamente, apesar das dificuldades militares e da pobreza de recursos, estruturando os socorros públicos de ajuda à população. Para tal criou uma comissão de médicos em serviço permanente para aconselhar e pôr em execução medidas necessárias como: instalação de hospitais para os doentes, organização da assistência ao domicílio, limpeza das ruas, prisões e habitações, enfim tudo o que fosse urgente para exercer a vigilância sanitária. Não obstante, a eficácia demonstrada foi tardia e não explica o erro inicial. É possível que a situação crítica do ponto de vista militar tenha levado a autorizar o desembarque dos belgas com receio de que uma recusa tivesse efeitos negativos no recrutamento de tropas mercenárias na Europa. (…)[2]

A epidemia atingiu, pois, muitas famílias portuenses que viram falecer desta doença alguns dos seus membros. Assim aconteceu na minha.

Joana Rosa da Graça, minha 5ª avó materna, faleceu a 13  de Junho de 1833, vítima da cólera no hospital improvisado  de S. Pedro de Alcântara, estabelecido na Quinta do Monte de Santa Catarina e que fora pertença dos Frades da Congregação do Oratório. E não fosse o seu viúvo pretender casar de novo, eu teria ficado na ignorância de um história de família com o seu quê de singular, pelo menos aos meus olhos de hoje, já que no passado tal situação seria relativamente vulgar.
E com quem casa o meu 5º avô em 1851?
Com Joaquina Rosa da Graça, irmã mais velha da sua primeira mulher, e com quem tivera filhos desde Agosto de 1834, o que significa que iniciou este relacionamento logo após a morte da primeira mulher. Os filhos são legitimados na altura do casamento, conforme consta do respectivo registo:
Vítor Rodrigues Cardoso, nascido em 4.8.1834  e casado em Miragaia, em 1859;
Eduardo Rodrigues Cardoso de Lemos, nascido em  5.3.1836
José Joaquim da Graça Rodrigues Cardoso, nascido em 3.4.1837. casado em 1857 no Rio de Janeiro, onde era caixeiro, e aí falecido em 1868;
Cristina Augusta, nascida em 15.9.1838

Na participação do óbito de José Joaquim aparece ainda  um José Rodrigues Cardoso de Lemos, que não averiguei quem fosse...

Partilho aqui esta história familiar, menos pelo interesse que possa ter em si mesma para quem não é da família , mas porque a considerei interessante por outros dois motivos:

1º o saber não ocupa lugar e a minha gente  ( e não só...) ficará a saber um pouquinho mais...
2º em genealogia nunca a investigação está acabada... novos documentos poderão vir a enriquecer esta história...
3º os mais imaginativos poderão criar estórias - que até possam servir de "hipóteses" para que se tornem histórias!


[1] Lusíada. História. Lisboa. II Série, n.° 1 (2004) Imaginario Social das Epidemias em Portugal no Seculo XIX, p. 95-125
[2] É certo que os liberais não foram os únicos a errar neste quadro político e militar. O governo miguelista só muito tarde se apercebeu do perigo de contágio (…) que a capital corria devido aos contactos com Aveiro e outros portos da Europa já atingidos (…)Assim, assoberbado com a preeminência das acções militares, reagiu tardiamente acabando por organizar hospitais para os doentes de cólera e tomar medidas de emergência para travar a propagação da epidemia semelhantes às do Porto.Ver o artigo citado para a extensão da epidemia a outras regiões de Portugal.

kwADPorto
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2 comentários:

  1. Gostaria de juntar um comentário à interessantíssima e singular história genealógico-familiar da Manuela Alves, mas por razões nem os técnicos de informática não sabem explicar, entre outras malandrices, o meu site do FB recusa-se permitir-me fazer comentários. O meu comentário ia referir-se a uma história genealógico-familiar que também tenho ligada com a Guerra Civil e a epidemia da cólera. Terei alguma forma de contar aqui a minha pequena história?

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